quarta-feira, 25 de junho de 2025

Poética

 

Imagem Pixabay

Tudo parado. 

É inútil 

o arrastar-se do caracol. 

 

Sôfrego, 

o gastrópode terrestre

corpo mole, cor parda

e concha calcária espiralada

se mexe na avenida movimentada

 

no sinal, abre e fecha; 

abre e fecha; abre e fecha. 

 

Cada saída, um muro; 

cada retorno, um círculo. 

 

E a rápida geografia da avenida 

nada mais é 

do que poesia em estado bruto.

 

Dos meus alfarrábios,

José Carlos Sant Anna, s/data


19 comentários:

  1. Tudo pode virar poesia, não é? Até um pitoresco caracol numa avenida que de geografia concreta, torna-se geografia para um olhar sobre o estar no mundo!

    Eu gostava de brincar com esses caras na infância, o quintal da minha casa era cheio deles!

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  2. Eros,
    penso, que teu poema é enxuto, contemplativo, e profundamente simbólico traduz em poucos versos uma sensação quase existencial de inutilidade diante da pressa do mundo.
    O caracol, figura lenta, frágil e determinada, torna-se metáfora do sujeito contemporâneo que insiste em mover-se mesmo quando tudo parece emperrado, quando toda tentativa de avanço parece fadada ao fracasso. O trânsito que abre e fecha os sinais sem piedade contrasta com a lentidão do gastrópode: é o mundo que não espera, que atropela.
    Há um lirismo sutil quando se diz que “cada saída, um muro; / cada retorno, um círculo” talvez um retrato do desânimo cíclico, do esforço que se dobra sobre si mesmo. Mas também há poesia na resistência: o simples fato de o caracol continuar se arrastando, mesmo na avenida veloz, pode ser lido como um ato de sobrevivência e de arte um “poesia em estado bruto”, como o próprio poema afirma. E a última linha
    “Dos meus alfarrábios,” é como uma assinatura fantasmagórica, como se o poeta tivesse tirado essa imagem da poeira dos livros antigos, das anotações íntimas, de um tempo em que o sentir ainda se arrastava com a delicadeza de um molusco. É um poema sobre o tempo, o cansaço, a persistência e a beleza que há em continuar, mesmo quando parece inútil. É um poema que ressoa em silêncio, como uma prece sussurrada no meio do barulho.

    👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻
    Abraço!

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  3. Lentamente. Muito lentamente. "Como se fossem intermináveis os dias e as luas e o sedentarismo dos antigos nos habitasse", o caracol não tem urgências, a contrastar com o movimento da avenida sem lentidão alguma. A poesia faz-se onde menos se espera e tudo inspira o poeta. Gostei da imagem. Os seus alfarrábios devem ter muitas surpresas.
    Tudo de bom, meu Amigo José Carlos.
    Um beijo.

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  4. Caracol sofre, hein!?
    E então numa avenida movimentada, com carros
    sempre a passar e os semáforos a cumprir, é dose.
    E lá vamos nós como o caracol pelas estradas da
    vida, arrastando-nos, sempre na mira de um dia mais
    leve, de uma gota de água fresca, de um dia de Sol.
    Porque o Sol quando nasce é para todos, dizem. Mas
    nem sempre é assim, ou quase nunca. Cada muro, cada
    tropeço. Ou conseguimos subi-lo ou temos de percorrer
    caminhos infinitos, ínvios, por vezes.
    Caro amigo José Carlos, uma poética que traz uma lição,
    no seu tom que parece não fazer mossa, mas que nos
    obriga a reflectir.
    Semana óptima, desejo-lhe.
    Beijinhos
    Olinda

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  5. Merece um kkkkk, poxa, você conseguiu fazer um poema
    sobre o caracol? Isso é inédito, crônica ainda vai, mas poema
    para caracóis?
    E ficou o máximo, um bicho que não anda, não grita, não
    se mexe e ganha um poema!! Essa você surpreendeu, querido
    amigo! E só podia... com esse espírito leve e brincalhão!

    "Sôfrego,
    o gastrópode terrestre
    corpo mole, cor parda
    e concha calcária espiralada
    se mexe na avenida movimentada"

    Maravilha!!! 😄🙋‍♀️
    Beijo, uma boa semaninha

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  6. Olá, amigo José Carlos, é sempre muito bom passar por aqui,
    espaço de cultura e arte, onde tenho a possibilidade de ler um
    poema de sua lavra, que deixa um lastro da sua inteligência e
    sabedoria. Mas não só isso, deixa um pouco de sua verve e
    que pelo seu belo poema me fez lembrar do nosso grande poeta Manoel de Barros.
    Votos de um bom final de semana, com saúde e paz.
    Grande abraço, amigo.

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  7. Pobre caracol, lo imagino en su arrastre mirando la gran avenida y el esfuerzo que supondria su arrastre, originales versos poeta es un verdadero placer leerte
    Un abrazo

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  8. Um pouco de aversão por este molusco.
    O poema é bonito.

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  9. Gostei do poema.
    O caracol não aprecio muito por ser dos que rastejam ,mas são interessantes carregando devagarinho esse casco duro.
    ( comentei aqui ,mas acho que se perdeu).

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  10. Já li poema sobra cebola, mas sobre caracol? Francamente! rs.
    Querido amigo, José Carlos!
    Um primor o seu poema sobre o caracol! Simplesmente adorei.
    Parabéns pelo seu talento.
    Um abraço.

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  11. Gostei do belo poema. Imaginei a estrada deixada pelo caracol.

    Bom fim-de-semana!
    Beijinhos.

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  12. E o trânsito da avenida por vezes anda à velocidade do caracol.
    Há dias, um até me ultrapassou. E ouvi o clássico "sai da frente palerma"...
    Gostei do seu poema, é magnífico.
    Traga mais dos seus alfarrábios...
    Boa semana.
    Um abraço.

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  13. Eros aqui para dizer que, mesmo devagarinho, esse caracol é o mestre zen da avenida! Enquanto a pressa domina tudo, ele é o rei da calma, abrindo e fechando sinal como quem dança ao som da própria poesia. Se todo mundo tivesse o ritmo dele, a vida seria menos corrida e muito mais poética e, olha, isso não é só papo de caracol, não!
    Agora, cadê a poesia poeta?

    Abraço ,
    Fernanda!

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  14. Olá Jose Carlos,
    Bem criativa e divertida a sua poesia sobre caracol.
    Confesso que é a primeira vez que li uma poesia do caracol e adorei.
    "E a rápida geografia da avenida nada mais é
    do que poesia em estado bruto".E as vezes nos sentimos assim, diante da correria do mundo.
    O caracol nos ensina a andar mais devagar.
    desejo um feliz dia

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  15. Fiz um comentário, mas não sei porque não publicou.
    Gostei muito do seu poema sobre o caracol.
    As vezes devemos ser igual a ele, devagar diante de tanta correria.
    feliz dia

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  16. Fiz um comentário, mas não sei porque não publicou.
    Gostei muito do seu poema sobre o caracol.
    As vezes devemos ser igual a ele, devagar diante de tanta correria.
    feliz dia

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Mil desculpas, Bandys, seu comentário não tinha chegado na minha caixa de mensagens. Como se dizia antigamente: quod abundat non nocet. O que abunda não se perde.
      Tenha um bom dia também.
      Hoje é feriado em Salvador. Comemoramos a Independência da Bahia.
      bjss

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  17. Você conseguiu fazer poema com caracol!!!
    Muito bom.
    Você já ouviu falar na proporção divina e número divino?
    É um número que se repete na natureza em todos os lugares onde não tem influência humana.
    A casca do caracol tem essa proporção.
    É um assunto muito maluco, mas é cientificamente provado.

    Um abraço!
    Tenha um lindo fim de semana.

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  18. ¿Sabes que los caracoles me trasladan a mi niñez? siempre que veía uno lo ponía entre mis manos y lo acariciaba y le cantaba la canción del caracol.

    Me ha encantado tu poema, de,muestra una gran sensibilidad, es un placer estar aquí. Ya te dejé enlazado para seguirte.

    Un beso y feliz día.

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Trenzinho Caipira

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